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Claro que, sendo eu uma escritora totalmente inédita, de extensa produção incubada, foi uma grande honra ser convidada pela Paula pra preencher este espaço. Uma honra e um baita problema. Mas olha, eu não vou pagar o clichê de dizer que tenho angústia da folha em branco. Não tenho esse negócio não, o problema é que eu não caibo na porra da folha!
Não é tanto que eu seja prolixa (espero que não), mas devo confessar que tenho uma mente patologicamente fértil. Preencho compulsivamente centenas de cadernos com escritos os mais variados. O que não significa nada em termos de qualidade, mas o fato é que com o passar dos anos (e eu já passei dos 30) isso se acumula e faz pressão pra sair.
Daí que, ao saber que poderia dispor deste espaço, começou a travar-se uma luta entre as diversas facções do meu ser.
Um lado Kamikaze ousou propor que eu publicasse em forma de folhetim meu novo romance, que ainda nem escrevi. A sábia Prudência fez-me arquivar esta idéia. O japonês contra-atacou com um dos 127 projetos de contos não-escritos (a latência marca boa parte da minha obra). Desta vez foi vencido pela Preguiça, guerreira poderosa! A Megalomania sugeriu que eu executasse finalmente a grandiosa tragédia-latino-musical em 5 atos sobre a ascensão e queda de Atahualpa. O Bom-senso foi capaz de dar conta dessa. Alguém ainda gritou lá do fundo se eu não podia desengavetar aquela brilhante sinopse de uma novela das 6. Ninguém respondeu. Sorte da Globo, que ainda pode fazer um ótimo negócio por módica quantia a combinar. E, como quem não quer nada, a Musa soprou em voz sussurrada que eu poderia editar minha Poesia Completa, em fascículos. Confesso que corei. Sou muito tímida pra mostrar assim minhas partes íntimas. Sorte de vocês, que podem ainda não estar preparados para minhas revoluções estéticas de gosto duvidoso.
Afinal restaram elas, minhas filhinhas desajustadas, o aspecto mais bizarro de minha pujança criativa: as invenções. Desajustadas porque me falta a linguagem adequada para expressá-las. Bem pior que meu português estropiado é minha matemática pré-primária, que vacila no 7×8 e não sabe fazer divisão por mais de um algarismo, e nem me venha com vírgulas! Muito menos sei fazer desenhos técnicos em perspectiva; Visão Espacial foi a nota mais baixa em meu teste de QI. Também não sou boa em formatar projetos e conseguir verbas para sua execução. Então, por que diabos eu fico inventando coisas que não posso produzir? Pergunte aos meus neurônios!…
E por que diabos vou expô-las aqui?
Bom, sabe aquela mãe amorosa que vê que um de seus filhos não vai além das pernas mas acha que ele tem tanto potencial, quem sabe se alguém lhe desse uma chance…? Aí, na hora de pedir um favor para o concunhado vice-presidente da estatal, pede um emprego justo pra esse filho – o que tem menos condição de ocupar bem qualquer cargo que seja – porque ela acha que os outros mais cedo ou mais tarde vão deslanchar por conta própria. Resultado: o filho competente não deslancha porque não arranja trabalho, o filho-problema dá com os burros n’água e a mãe zelosa passa o resto da vida se penitenciando.
Pois é, burrice maternal não tem cura. O fato é que eu me apiedei das minhas invenções, acho que elas poderiam trazer enormes benefícios à humanidade e, mesmo correndo o risco de vê-las usurpadas, resolvi trazer a público o prof. Pardal que vive em mim (srs. Usurpadores: aceito depósitos dos royalties na minha conta bancária mas, se não for possível, meu nome nos créditos e amostras grátis vitalícias já seriam algum alento). Outro modo de dizer é que tenho idéias pra dar e vender e, já que ninguém compra, resolvi liquidar pra livrar espaço no estoque.
Não preciso nem dizer que houve briga na fila pra ver quem ia entrar na “coluna”, mas priorizei os inventos de maior impacto sócio-cultural. E não falo de produtos Tabajara, a coisa é seriíssima e profunda, como provarei em seguida.
A primeira invenção é também a mais urgente. Tão necessária e ao mesmo tempo tão simples que causa-me assombro que ainda não a tenham inventado: trata-se de uma mãozinha para passar filtro solar nas costas. Não ria ainda; pare e pense: há quanto tempo você precisa de uma e não sabia? Como aquela, que o vovô já usava pra coçar as costas, mas dotada de uma esponjinha para espalhar o filtro nas áreas inalcançáveis. Eu estou cheia de umas pintas suspeitas nas costas pela falta de tal produto no mercado. Não adianta fazer campanha preventiva de câncer de pele se a gente não consegue passar o fotoprotetor onde mais precisa.
O amigo desenhista industrial a quem pedi ajuda para desenvolver o projeto, relutante em admitir que alguém tão desqualificado quanto eu pudesse ter uma boa idéia em sua área de atuação, desdenhou do potencial comercial do produto:
– Coisa para solitários! – riu-se ele, que é daquelas raríssimas pessoas casadas há anos com sua alma gêmea e feliz para sempre, portanto nunca lhe faltou quem passasse filtro solar em suas costas com calorosas mãos humanas.
Cometeu o erro n° 1 em processos criativos, segundo qualquer almanaque gerencial para o desenvolvimento de criatividade (tipo da obra que é um paradoxo em si mesma): descartar uma idéia por um preconceito.
Mas o descrédito do amigo não arrefeceu meu entusiasmo. Tinhosa que sou, uso a crise como dificuldade-que-leva-à-oportunidade, mais uma vez seguindo a cartilha do criativo de sucesso. Comecei a pensar nessa coisa dos solitários (mais especificamente nas solitárias e nos gays, mas em breve dedicarei algum tempo a pensar soluções para homens em apuros) e cheguei então a desenvolver as versões mais avançadas do produto: mãozinha dum lado, consolo do outro. Em variados tamanhos e formatos, tudo vibratório. Substitui noivo, namorado, amigo e amante, com vantagens. Cabe na bolsa, vai à praia na hora que você quer e não fica olhando pra bunda de ninguém. Além de tudo, é mudo, como os sábios. Sucesso na certa!
Fui pedir ajuda a uma amiga, também versada nos desenhos técnicos, e ela me brindou com essa pérola da mediocridade, tipo da ponderação que, desde que o mundo é mundo, atravanca o progresso:
– Se a idéia fosse boa, alguém já teria tido…
A todas essas, ficamos aqui, à beira do melanoma, à espera de que alguém de visão resolva encher os bolsos no próximo verão.
Segunda idéia, também de grande apelo comercial, embora exija um pouco mais de investimento. O nome é genial, e eu patentearia, se não fosse tão caro fazê-lo: Cyber-Coiffeur. Moderno, pomposo. Faria sucesso em São Paulo. O conceito é arrojado. Tecnologia de ponta, chapinhas de última geração, cauterizações a laser de esmeraldas, densitometrias capilares digitalizadas, mega-hair transgênico a partir de células-tronco. Ambiente futurista, meio Barbarella (acho que preciso rever meu conceito de futurista). Mas a grande revolução conceitual é questionar o inquestionável, mexer no imexível, portanto: no Cyber-Coiffeur não haverá sequer um exemplar de Caras! Não, ao invés disso as mulheres antenadas de hoje serão brindadas com um laptop conectado à internet, totalmente customizado para se compatibilizar com as atividades de um salão (e resistir às suas agruras). O potinho para molhar as mãos é um mouse adaptado e o teclado é impermeável para que a ocupada perua possa administrar seus fundos de ações, checar seus e-mails e, hum, dar uma passadinha no site de Caras, que ninguém é de ferro!
Antes que me acusem de elitista, devo esclarecer que meu talento não distingue classe, cor ou credo, e eu também tenho minha contribuição para o Fome Zero. Trata-se de um projeto social-ecológico, uma excelente fonte de desenvolvimento sustentável: O Projeto Jaca-já. Esse eu gostaria sinceramente que alguém desenvolvesse, uma ong ou o que seja, podem usurpar.
Consiste em aproveitar a enorme abundância de jacas da Floresta da Tijuca como fonte de alimentação e renda para comunidades carentes. Explico: a jaqueira, originária da Índia, por sua adaptação ao nosso ambiente e rápida proliferação, tornou-se uma praga nas matas do Rio de Janeiro. Andaram até fazendo matança delas recentemente. Um desperdício. Cada jaqueira dá, facilmente, até 30 jacas de uma só vez. Cada jaca pesa, no barato, 3 quilos. São quase 100 quilos de alimento em uma só árvore, uma montanha de nutrientes que poderiam estar enriquecendo a dieta de nossa população. O problema é que a maioria das pessoas tem aversão à jaca in natura, por causa do cheiro forte exalado por seu visgo. Mas a carne mesmo da jaca é tenra e cheirosa, dando ótimos doces, compotas e outros derivados (juro que é bom, eu adoro!), e seus caroços também podem ser deliciosos se cozidos (parece pinhão) ou torrados (parece castanha de caju). Acho até que o visgo deve servir para alguma coisa, uma espécie de cola, porque o troço gruda que é o cão! Então, se fosse organizada a coleta e o beneficiamento comunitários da jaca, poderíamos utilizar seus subprodutos como reforço de merenda escolar (espero que toda uma geração de escolares não me odeie por isso) e vender o excedente, com renda revertida em benefício da própria comunidade. Seria uma boa forma de controlar a praga e a fome ao mesmo tempo.
A versão nordestina do projeto, em moldes similares, atenderia pelo nome de Já-Cajú.
Enfim, está lançada a idéia, e isso é o melhor que posso fazer.
E, por fim, uma reflexão que me parece gritante, mas eu pareço ser a única pessoa no mundo a formular esta pergunta tão básica: porque fazemos carros que matam? Coloque uma lata em movimento a mais de 100 km por hora e é certo que, em algum momento, ela irá se chocar contra algum obstáculo. Porque não é uma questão de se. Todo carro vai bater algum dia, é só uma questão de quando e com que violência. Mas a colisão é certa. Mesmo que você seja cuidadoso e dirija bem, sempre haverá o momento em que a pilastra sairá andando bem no dia em que você mandou ver na caipirinha. E, por menor que seja a batida, amassa o raio da lata, descasca a pintura. Isso na melhor das hipóteses, porque todo mundo já perdeu alguém querido, ou no mínimo soube de alguma perda humana irreparável em um acidente. O número de acidentes de trânsito com mortes é brutal, mas ninguém parece chocado, enquanto a violência e as epidemias causam grande alarido, exigências de soluções.
Portanto soa meio despropositado, mas não me parece bizarrice pura questionar a premissa de que carros devam ser feitos de lata. Porque não de borracha, ou um plástico resistente porém flexível (talvez feito de visgo de jaca), capaz de absorver o impacto e voltar à forma original, preservando sua integridade e, o que é mais importante, a das pessoas em seu interior?
Bom, e já que estamos questionando premissas, vamos combinar que essa coisa de roda é um conceito meio, digamos assim, pré-histórico. Se já temos a tecnologia da propulsão a ar, poderíamos voar baixo, rente ao chão, sem atritos e sem cair em buracos. Sem falar que trocar pneu, nunca mais. Não seria uma glória? As fábricas de pneus poderiam se dedicar a fabricar as carrocerias, que poderiam ser coloridas como super-melissinhas turbinadas, e eu quero o meu modelo com pochetezinha!
Enfim. Cumprida minha obrigação para com o futuro da humanidade, deixo a vocês a responsabilidade de julgar e fazer cumprir, ou não, minhas pobres idéias.
Poderia falar também de uma tal máquina de filmar sonhos, que o Gil sugeriu numa música, eu comecei a pensar como seria e acabei escrevendo um livro inteiro sobre o assunto. Mas isso já é outra história…
É o que tenho por hoje.
Foi um prazer estar aqui com vocês.
* * *
pensata:
Sou um ser pensátil
portanto inútil.

2 Responses to “As Invenções Bárbaras”

  1. rita de cassia says:

    nãoo preciso dizer nada

  2. buy vicodin vicodin half life vicodin withdrawal buying vicodin vicodin cod vicodin addiction vicodin es tablet what does vicodin look like online vicoden vicodin for sale how long does vicodin stay in your system pill vicodin purchase vicodin online vicodin addiction treatment snort vicodin generic picture vicodin vicodin danger vicodin mexico vicodin m357 vicodin vicodin online purchase vicodin

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