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O Chamado

Uma coluna semanal para falar de espiritualidade. A espiritualidade não se interessa especificamente pelo nosso corpo, não se ocupa dos nossos sentimentos e não valoriza a nossa inteligência.
Então vamos falar de felicidade, tentei resumir para garantir o ibope, é mais ou menos a mesma coisa, essa palavrinha banal que usamos muito no dia-a-dia mas poucos conseguem conceituar. Pode ser um começo.
Quando nosso corpo ou nossas finanças vão mal nós ficamos infelizes, não tem jeito. O mundo físico é o que abriga o animal que somos e nossa primeira preocupação é garantir a sobrevivência: alimento e toca. Sem cama e mesa garantidos não conseguimos pensar em mais nada.
Mas o homem não quer só comida: junto com diversão e arte quer também amor, precisa nutrir o seu mundo emocional.
Como somos sofisticados, desejamos ainda algo mais do que comida e emoções – afinal, somos seres que pensam. Então, somos também políticos, precisamos de justiça, pessoal e social, e queremos viver debaixo de regras aceitáveis.
Teorias consistentes, todas elas verdadeiras, tentam explicar os desejos que nos movem mas nenhuma delas é capaz de, sozinha, desenhar o mapa da nossa felicidade. Somos o homo sapiens, o homem capaz de sabedoria, descendente direto do casal primordial e com a missão bíblica de “dominar sobre todos os seres da terra”.
Para Marx, é preciso comer para depois poder desejar, pensar e agir. Na base da história estão as relações econômicas de cada grupo. Para Freud, o desejo sexual, a libido, é o motor de toda a atividade humana, a força geradora da manifestação artística, científica e social. Adler, discípulo de Freud, identifica como papel preponderante no desenvolvimento humano a vontade-de-poder, já que o poder implanta a lei. Como correr atrás da nossa felicidade: privilegiando o corpo, a emoção ou a inteligência?
A experiência clínica de Jung levou-o à descoberta de um plano mais sutil ainda do que o plano da mente: o homo religiosus junguiano tem origem numa camada mais arcaica do que o homo sexualis de Freud ou o homo oeconomicus de Marx. Este arquétipo, central e totalizador, foi chamado de “self”.
Os quatro elementos alquímicos estão simbolizados em teorias consistentes que procuram explicar o impulso gerador da ação humana. Não são teorias excludentes, são complementares. Todos os seres experimentam, em maior ou menor grau, estas pulsões primordiais e outras já descobertas ou por descobrir.
O desejo de se religar à fonte original, fundamento do homem religioso, gera um “descontentamento divino” que nem o corpo, nem a emoção, nem o poder podem aplacar. É a experiência de “estados de ser cada vez mais perigosos”, como diria Artaud. É uma inquietude à espera de um chamado.
Chamado é vocação.
Uns afirmam que o chamado tem origem divina. Outros dizem que somos apenas nós – afastados de nós mesmos -, chamando para o “religare”. O que quer que este chamado seja, seguir a nossa “vocação” é sempre um ato espiritual e religioso. Ainda que praticado por ateus.
* * *
Agradecendo o espaço no Epinion, a Esquizotérica estará aqui todas as semanas – meio esquisita, às vezes esquizóide – abordando assuntos que interessam a poucos. Uma coluna que não dará receitas de beleza, não dissertará sobre as 537 maneiras de seduzir um parceiro nem aumentará o seu coeficiente intelectual. Pretende ser, apenas, um espaço de debate e troca para quem está interessado em entender e atender às suas vocações.

One Response to “O Chamado”

  1. Tom Lobo Vermelho says:

    Oi, gostaria de mandar um poema xamânico que estou dedicando a você?
    Para qual e-mail mando?
    abraços da Lua
    Tom Lobo Vermelho

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