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a poça*

 

à sombra do lustre rosaRenoir-WomanRose.jpg

a moça posa pro moço

qual nem lhe fizesse mossa

o assombro

 

do observador atento

sentado ali do outro lado

rabiscando em alvoroço

intenso

 

seu repasto um guardanapo

o lápis rasgando o lenço

mil traços por cada canto

da mesa

 

como quem desse de ombros

a moça finge que almoça

lenta acaricia a louça

inglesa

 

disfarça faz vista grossa

assopra a colher de sopa

no prato intacta a poça

espessa

 

brinca com a coxa de frango

de sobremesa morango

o tempo suspenso em pausa

pro almoço

 

penso que essa noite enquanto

o olhar do moço repousa

(pálpebras em movimento)

 

na penumbra do seu quarto

uma mariposa pousa

no esboço

 

ao ver-se ali num espanto

de asas o olhar se apossa

esvoaça e roça o pescoço

da moça

 

imagem: Auguste Renoir, HEAD OF A WOMAN or WOMAN WITH A ROSE

 

[ arquivo em audio >>a poça ]

* Este poema me veio a partir de uma brincadeira com o Guga sobre as diferentes pronúncias da palavra poça, no Rio em São Paulo. Aqui, as duas formas são possíveis, à escolha do freguês. Como você prefere, pôça ou póça?

 

9 Responses to “a poça*”

  1. dalva says:

    Helena! Esse poema é lindíssimo! Pena que a fama só venha tarde demais…Daqui a muito tempo, quando a gente já for só lembrança, eles vão desenterrar os nossos versos do pó e dizer: uia! Havia vida inteligente no planeta. Pouca, mas havia.

  2. googala says:

    Prefiro semáphoro. ahahah

  3. Olga says:

    Prefiro “pôça”. O som aberto me lembra a maneira estranha de pronunciar “Roraima”, que sempre me faz rir quando ouço.
    Quanto às maneiras diferentes de vocabulário entre Rio e SP, vou mandar por um e-mail algumas que li outro dia e achei legais, ok?
    E eu moro numa rua movimentadíssima, no último andar, e mesmo assim, acredite, tenho recebido visitas inusitadas de besouros, borboletas-mariposas-e-afins, lagartixas…e gosto, quebra um pouquinho a coisa concreta.
    Quanto ao poema: lindo! Lindo e sensual.

  4. Christiana Nóvoa says:

    Dalva, do pó à poça, agradeço (e apósto que você fala póça, dona môça!)
    .
    googala, farol ainda vai, meu, mas semáforo, vamos estar combinando que parece até desaforo…
    .
    Olga, os insetos devem andar à procura de uma certa folhinha que eu prometi ;) Mas ela tá aqui, ó, olhando pra mim. Já já nossos ponteiros enfim se acertam.
    .
    Beijos de mariposa.

  5. Clarice says:

    Lá no interior era póça. Aqui ficou chique, virou pôça. É que a água de onde vem é diferente.
    Abraço.

  6. Clarice says:

    Lá no interior era póça. Aqui ficou chique, virou pôça. É que a água de onde vem é diferente.
    Abraço.

  7. Clarice says:

    O comentário em dobro é por conta da tanta chuva. E pôças.
    Um poemito assim milhado por conta de uma poça só faz bem a quem lê.

  8. Flertar desta maneira com as palavras, em São Paulo ou no Rio, renderá sempre uma boa surpresa!

  9. Christiana Nóvoa says:

    Eu juro que tinha respondido à Clarice mas, com a atualização do blog, sumiu. Caiu na poça :)
    .
    Felipe, a moça agradece!
    .
    beijos

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